Independente do espaço, através do qual se deslocam a rapidez da vibração, do relâmpago, do pensamento; libertos das influências do tempo que desconhecem, os Anjos não sabem o que sejam infortúnios, calamidades, caducidade do homem e das coisas. Tempo virá em que a Terra será destruída e que "extintas completamente, as estrelas se hão de pulverizar". Os Anjos, porém permanecerão, os espíritos que foram, são e serão, conforme aquelas palavras do apóstolo: "As coisas visíveis são efêmeras, as invisíveis são eternas". Ora os Anjos não se vêem, pois são de natureza simples, essencialmente espiritual, isenta da mais microscópica substância material. Eles são, tal qual o ponto imaginário da geometria, realidades subsistentes, emponderáveis como o ponto, sem forma nem volume; substâncias simples que nem sequer pode comparar-se com o átomo das terríveis e maravilhosas invenções modernas, embora invisível e impalpável ele também. Aglomerando um número estonteante de átomos, a natureza forma um grão de ferro ou de pedra, uma semente pequenina, uma minúscula gota; mas amontoando miríades de milhares de Anjos em um átomo sequer obteremos...
Os teólogos são concordes quanto a perfeita espiritualidade dos Anjos. Embora não se trate de verdade de fé, todavia, no ensino eclesiástico, é doutrina admitida e a linguagem corrente lhe faz frequentes alusões, como demonstram frases como a seguinte: "belo, puro como um Anjo". Não se pode no entanto afirmar, em absoluto, que não tenha havido, aqui e ali, certa divergência sobre o assunto.
Efetivamente alguns chegaram a fazer da espiritualidade dos Anjos objetos de dúvida e de viva discussão; outros negaram-na totalmente atribuindo às criaturas celestes não um corpo etéreo, levíssimo, mas sim um corpo de matéria grosseira, necessitado de alimento especial embora desconhecido. Mas semelhantes opiniões não passam de outros tantos erros aparentados com o antropo morfismo pagão e contra os quais não conseguiram imunizar-se homens como São Justiniano, São Basílio e Orígenes. Segundo este, os anjos precitos aglomerar-se-iam em redor dos sacrifícios, "ávidos dos sangue das vítimas e dos vapores por ele exalados".
Todavia o erro mais grosseiro perfilhado pelos antigos foi de admitirem nos Anjos a possibilidade de relações carnais com criaturas humanas. Atribui-se tal erro a certos manuscritos dos "Setenta"nos quais os descendentes de Set - de que fala o Gênesis 6,2 como sendo filhos de deus apaixonados pelas filhas dos homens e desposando-as são - são chamados anjos por interpretação errôneo. É sobretudo surpreendente notar que com muita frequência os antigos escritores cristãos cometeram semelhante erro, não obstante as explícitas alusões à perfeita espiritualidade e pureza dos Anjos, como se vê por exemplo em São Mateus(22,30) onde Jesus explica aos saduceus que os homens e as mulheres "depois da ressurreição não se casarão, mas serão como Anjos de Deus no Céu". Em oposição à estas concepções erradas, afirmam-se diversos Padres e Doutores , entre eles São Gregório de Nazianzo, Dionísio Areopagita e Santo Ambrósio. "Temos de convencer-nos - escreve um deles - que nos Anjos nada há de material, nem sequer a mais tênue sombra de corpo, ainda a mais delicada e imponderável que se queira imaginar Um ponto já é demasiado para indicar a simplicidade angélica; o relâmpago rasgando as nuvens, o fogo mais sútil, o vapor mais volátil são outras tantas imagens inadequadas e impróprias".
Entretanto é ao angélico Santo Tomás de Aquino que se deve a sentença definitiva sobre esta questão há séculos debatida. Estudante ainda, interessou-se ele pelo estudo da espiritualidade das criaturas celestes e defendeu-a tenazmente pela vida afora.O seu genial tratado sobre os Anjos, pela sua inigualável síntese teológica, é o testemunho fiel do que afirmamos. Todos vão haurir desse tratado como da fonte mais segura e autorizada, pois ele constitui, sem sombra de dúvida, um dos mais preciosos dons feitos à ciência e à cristandade. É a mais bela de amor á esses seres invisíveis, nossos intermediários e amigos , homenagem prestada por Santo Tomás que foi também na terra isento de pecado sensual, puro e angelical.
"Esta é a hora dos Anjos" - Giovanni P. Siena
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