“Desde que eu era adolescente, Deus Nosso
Senhor me concedeu a graça de perceber, com nitidez, esta realidade que toca
intimamente a existência de todos os seres humanos: a vida é um breve lapso,
apenas um piscar de olhos, comparada com a eternidade que nos espera depois
desta passagem fugaz pelo tempo.
Lembro-me que eu gostava de subir, pelas
tardes, a um dos morros que ficavam ao redor de Cotija, minha cidade natal, e
dali, conversando com Deus, contemplava lá embaixo, ao pé da colina, o cemitério,
com seus túmulos adornados de flores; mais adiante, na planície, os telhados
vermelhos das casas e, como que fincado em meio a eles, o campanário, com a
cúpula da igreja paroquial. Perguntava-me com palavras simples que pode haver
na cabeça de um menino do campo de 13, 14 anos, o que é esta vida, se afinal de
contas, todos vamos acabar num túmulo. Nesse cemitério, jaziam os habitantes de
Cotija de outros tempos. Somente uns poucos ainda arrancavam lágrimas da viúva
ou de órfão prematuro. Outros, os restantes, abandonados em completo
esquecimento. Uns viveram na opulência, grandes latifundiários ou hábeis
comerciantes. Outros, na angústia de uma miséria nunca vencida. Uns e outros já
tinham acabado a sua existência. Para que tinham servido àqueles as suas
riquezas? E que sentido teve a vida pobre e aflita destes?
E depois, pensava nos outros: nos vivos,
aqueles que transitavam pelas ruas e pela praça principal, nos sítios e nas
fazendas vizinhas, os que eu conhecia e via todos os dias. E pensava também nos
milhões de homens que, em outros povoados, em outras cidades, em outros
continentes, por trás dos morros limítrofes, gastavam a vida em mil afazeres,
cada qual absorto nas suas preocupações, desenrolando o fio indecifrável com
que se tece a trama diária da existência humana. E pensava que todos eles
andariam por estas terras alguns anos: 20, 40, 80, talvez mais de um século: e,
no final, o mistério do nada, que parece engolir os que se vão. O que é que
permanece, afinal, ao longo da vida, se até a recordação dos mais velhos se
dilui na névoa da memória?
Estas são as reflexões que atravessam de
ponta a ponta a história da humanidade, as interrogações que cada geração tem
que enfrentar, os enigmas que têm que ser resolvidos por todos os homens que
não se resignam a um simples vegetar pelo mundo e que procuram se dar alguma
transcendência. “De que serve ao homem ganhar o mundo inteiro, se vier a perder
a sua alma?, perguntava Jesus Cristo aos seus ouvintes.
Eu me dava conta de que podia escolher
entre dois caminhos. Um, o caminho fácil de “ir levando” a vida sem maiores
preocupações; conseguir uma boa fonte de recursos para a família, procurar
ganhar um bom dinheirinho, evitar do melhor modo possível os desgostos da vida
e gozar ao máximo os poucos anos que tinha pela frente.
O outro caminho se mostrava mais árduo.
Consistia em construir a vida, minuto a minuto, olhando em direção à
eternidade. Encarar cada instante do meu tempo como uma oportunidade que Deus
me concedia para fazer algo por Ele e pelo bem de meus irmãos. “Investir”, por
assim dizer, cada segundo em algo construtivo, em algo que servisse para os
outros e me assegurasse, além disso, a vida eterna.
A opção era clara. E, assim, sobre aquela
colina, ao abrigo do crepúsculo aceso, ia amadurecendo no meu interior, tarde
após tarde, a idéia e o propósito de que teria que gastar a minha vida inteira
por algo que realmente valesse a pena, por algo que eu pudesse levar comigo à
eternidade. Compreendi que o tempo de minha vida, na verdade, não me pertencia.
O importante, então, não era a minha vida, nem a “minha” realização, mas a
realização do plano de Deus do qual eu não era mais do que um elo.
Ao mesmo tempo, pude compreender que o
mais importante não era a quantidade de tempo que tinha à disposição. Além do
mais, a ninguém é dado sabê-lo de antemão. Entramos na vida num ponto
determinado mas, uma vez que empreendemos o caminho, a incógnita do ponto final
nos acompanha sempre, e só se elucida quando ele chega. No entanto, mesmo que
não importasse a quantidade de tempo que eu teria, uma coisa era certa: fosse
qual fosse a duração de minha vida, sempre acabaria sendo curta, muito curta,
apenas um ponto em meio à eternidade. Portanto, o importante e o urgente era
aproveitar com avareza, do modo mais inteligente e produtivo, o tempo presente,
cada momento presente.
Aquelas tardes de meditação na minha
adolescência sobre uma colina ao sul de minha Cotija natal ensinaram-me também
que as criaturas são meios que Deus me dá para me unir a Ele e louvá-lo,
através delas, ao longo da peregrinação temporal. Pude desfrutar intensamente a
harmonia da criação em todas as manifestações da sua beleza: o despertar de
cada aurora, o canto dos passarinhos, o murmúrio de um riacho, a grandeza
imponente das montanhas, o colorido vivo dos prados na primavera, a brisa
serena e fresca nas tardes de outono, o céu nas noites estreladas, toda a
formosura que a natureza oferecia me serviu de caminho para chegar a Deus. E,
no campo das relações humanas, pude apreciar o valor da amizade sincera, a
beleza das almas agradecidas, até mesmo o afeto que muitas pessoas me
dispensaram. E, acima de tudo isso, prevaleceu, de maneira absoluta e
contundente, o meu enraizamento total e exclusivo em Deus, a rocha inamovível,
eterna, que sustenta todas as minhas certezas, meus anseios, minha segurança.
Em Deus, o único amor que pôde roubar o meu coração. Em Deus, origem e meta
única do meu destino temporal e eterno.
Caríssimos irmãos em Cristo
Jesus,
convido-os a pararem um momento para considerar o que é que estão fazendo com
suas vidas, para analisar se, nos anos vividos, satisfizeram as expectativas
que Deus colocou em vocês. Se perguntem, sinceramente, fixando o olhar
na eternidade que se aproxima, o que querem fazer com a porção de vida que
ainda têm pela frente.
Pensem que vocês receberam dons muito
grandes de Deus: a existência, o batismo, a fé, o conhecimento de Jesus Cristo
e muitíssimos outros. Vocês foram chamados a uma missão muito importante neste
brevíssimo lapso que transcorre entre o seu nascimento e a hora que terão que
partir para a eternidade. A vida de vocês é uma peregrinação, uma passagem
fugaz pelo mundo. Em meio e através de suas ocupações cotidianas, em meio e
através da necessária luta diária para construir a sua existência terrena, o
que é que estão fazendo para ganhar a sua vida eterna?
Todos vocês já devem ter lido e conhecem
muito bem a “Parábola dos talentos”. Ela nos mostra que cada homem, ao entrar
na vida, recebe de Deus uma certa quantidade de “talentos” (entre os antigos,
uma grande quantidade de dinheiro). Cristo usa esta imagem para explicar que a
tarefa primordial da vida é “investir” esse dinheiro, fazê-lo produzir e
entregar ao Criador os lucros no dia de nossa entrada na eternidade. Um dos
principais “talentos” que Deus nos confia é precisamente o tempo.
Estou convencido que no dia em que nos
apresentarmos ao Senhor, um dos primeiros pontos de nossa prestação de contas
deverá ser este: qual foi o uso que fiz do tempo que tive nas mãos, quais foram
os lucros que obtive para Deus no investimento de meu tempo. Neste dia, não
seremos censurados por ter perdido, talvez, a oportunidade de ganhar um milhão
de reais, mas por ter perdido um minuto! “
Texto extraído do livro
“O tempo e a eternidade” de Padre Marcial Maciel, sacerdote mexicano
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